Falar de Literatura ou mesmo
dos tais movimentos literários parece uma atividade incompleta. Falta sempre
uma parte do texto, a qual só poderá ser preenchida pelo ato de sentir o texto
literário.
Alguns leitores entenderão
bem o que é isso.
Desta forma, certo é que
nenhuma descrição de outrem alcançaria a sensação do mergulho na escrita
daqueles que foram os modernistas cearenses. No suplemento Maracajá (assunto de
nossas duas últimas postagens), ao lado de Jáder de Carvalho encontramos
compilados grandes nomes dos literatos dessa época. Hoje, concomitantemente,
abrimos espaço para estes outros escritores e, nesses outros escritores, o
espírito literário no qual Jáder de Cravalho deixava fluir sua escrita.
Iniciamos com Tocando na mesma inúbia de Paulo Sarasate,
publicado na segunda edição do MARACAJÁ:
Você da <<Antropofagia>>, não adivinham como a gente está
satisfeita. É assim mesmo que nós queremos. E é assim que a coisa tem de sahir.
O sul chamando o norte. E o norte chamando o sul. Convidando-o para a luta.
Assanhando as energias moças do lado de cá e de lá.
Movimento assim é que é. Esforços conjugados. União das duas bandas.
Com o oéste tambem. Tudo gritando brasilidade. Tocando na mesma inubia. Comendo
na mesma cuia. Brasileiramente. Antropofagicamente.
[...]
De Rachel de Queiroz,
extraímos esse trecho de Se eu fosse
escrever o meu manifesto artístico, texto que finda a primeira edição do
suplemento :
[...]
Além do que, só comprehendo e admiro uma manifestação artística quando
é expontanea e sincera.
E, sinceramente, expontaneamente, meu coração só pode sentir e cantar o
que sente e canta minha raça.
A interpretação de sentimentos extranhos, de belezas extranhas, feita
por informação ou intuição é forçosamente convencional, falsa oi impessoal.
Eis porque sou nacionalista, eis porque dentro de meu nacionalismo inda
me estreito mais ao circulo de meu regionalismo.
É que sinto que quanto mais proxima e familiar a paysagem, quanto mais
intimo o motivo de inspiração, quanto mais integrado o artista com o modelo,
mais fiel, mais expontanea e sincera será sua interpretação.
Eis porque eu canto o sertão, o sol, o Orós, as carnahubas, o algodão,
os seringueiros, os jagunços, os cantadores e os vaqueiros, a caatinga, a
Amazonia, a praça do Ferreira e o Cariry; eis porque canto o presente
tumultuoso de minha terra e o seu passado tão curto, tão claro, tão cheio de
expansão e vitalidade que é quasi um outro presente.
O primeiro numero de <<Maracajá>> foi espalhado por todo o
globo e até por fora do referido esferoide.
A esta hora qualquer habitante de Marte já estará fazendo antropofagia.
Vocês lá do sul que escreveram sobre o gato selvagem do nordeste toquem
nos ossos.
Isso!
Nós estamos ligados por um sentimento unico – o da voracidade.
Juntemo-nos para comer tudo o que deva ser comido no Brasil.
A.
G.
Vocês do sul desculpem os typographos do Ceará. Elles não pderam fazer
uma revista melhor.
Si tivessem mais recurso material, mostrariam como o cearense sabe
tirar dois couros de um bode só.
Por fim, alguns anúncios (ou
annuncios, como era grafado no suplemento):
Annuncio
Olhem vocês do sul: o Ceará exporta couros de bovinos, caprideos e
lanígeros. E tambem de obras e lagartos. E algodão. Se vocês quiserem partidas
desses produtos, dirijam-se á EXPORTADORA CEARENSE LTD, uma das melhores firmas
exportadoras do Ceará.
Annuncio
Olhem vocês do sul: vocês devem dormir em rêde como nós dormimos. Os
tupiniquins nunca viram camas. Digam aos importadores dahi que peçam dez mil
redes á Usina Gurgel (Siqueira & Gurgel Ltd) Fortaleza.
Annuncio
O verdadeiro antropofago bebe agua mineral Lambary. E quem não quiser
ser comido pelas doenças internas (que são aquellas que devoram o sujeito de
dentro para fora), deve igualmente beber agua mineral LAMBARY, de que o
Benjamin Torres é agente na Fortaleza de Nossa Senhora da Assumpção, do Siará.
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